Isabel Fontes

Prosa e algo mais...

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Localização: Amadora, Sintra, Portugal

Chamo-me Isabel Fontes, sou alfacinha de gema, mas vivo na Amadora desde o ano passado. Adoro escrever, é o meu escape para tudo o que existe de mal na vida e no mundo. Tenho 29 anos, sou Assistente Financeira\Direcção. Mas a minha área são as artes(Design). A vida dá voltas e voltas e quando dei por mim não estava a tirar artes mas sim a seguir o dinheiro. Acabei por tirar um curso de Contabilidade e Fiscalidade, entre outros. Apesar de tudo, adoro o que faço e isso, é o principal.

junho 16, 2004

Sem a mínima precisão de semântica

Por vezes penso no que raio me leva a acordar todos os dias? Tento distrair-me com as luzes lá no alto e todos aqueles anúncios com cheiro a morte. Ando sempre numa velocidade vertiginosa, para lá da ordem. Ás vezes chego mesmo a desejar um deslize, um pequeno azar com a embraiagem ou com a direcção do volante, qualquer desculpa para poder faltar uma vez. Uma única vez, sem sentir a culpa que carrego todos os dias, nem que para isso tenha que ficar imóvel numa cama de hospital.
Por vezes penso o que é que venho aqui fazer todos os dias? Enquanto empurro a merda do portão que todos os dias se queixa de ser aberto. Preparo o meu sorriso já de plástico para quem quer que veja ao entrar, o sorriso que preparo todas as manhãs ao espelho da casa de banho antes de entrar no duche. Chego sempre a tempo de ouvir as lamúrias do vizinho do lado, encolho os ombros, abano com a cabeça e dou uma resposta sem a mínima precisão semântica. Chove?
Por vezes penso mas afinal que faço de tão especial aqui? Dirijo-me para a minha secretária, enquanto atravesso o corredor encontro um colega a quem cedo um aperto de mão cordialíssimo e o sorriso já programado. Sempre demasiado atempado. Antes de me afundar no cadeirão, com um cheiro a pele rasca, ainda tenho tempo de enfiar a cabeça no túnel de segredinhos e mal dizer que sobrevoa como uma nuvem escura aquela sala do posto de comandos. Demasiado pesado. Ainda a tempo de preparar a minha íris, tal qual os violinos aguardando o arranque do mestre, para mais um dia de fuinha em frente ao computador.
Por vezes penso, mesmo antes de começar a roer as unhas, na lógica de todas as reuniões? Mesmo antes de me debruçar sobre os assuntos cujos conteúdos nunca relato a ninguém, ordens da direcção, senão á estátua que fica do outro lado da janela mesmo por cima da minha cabeça. Costumo andar ás voltas na cadeira a tentar perceber se algum dia chegarei a entrar na órbita do cimento que me rodeia e todos os dias reparo que o parapeito da minha janela mais uma vez foi esquecido pelas empregadas de limpeza. Será que faço parte de um sistema novo de munições onde o excesso faz rebentar?
Quando começa a época da chuva? Será que nunca chove?
Talvez quando chover possa limpar do meu couro cabeludo estes pensamento que me absorvem e consomem todos os dias, talvez consiga dissipar tudo o que há de mal em mim e consiga ver para além do muro que existe há minha volta. Talvez depois consiga abrir o portão sem ele fazer barulho e passar despercebido por todos sem ter que ouvir os mexericos a furarem-me o tímpanos todas as manhãs. Vou tentar abstrair-me dos comentários de toda aquela gente que não consegue estar satisfeita com o seu trabalho, com os seus chefes, com tudo o que fazem na vida medíocre que levam e falam pela calada.
Só quando chover vou poder deitar fora todos os meus casacos escuros e chapéus de varetas partidas, quebradas por tácticas de olhares e ritmos vocais que consumo diariamente sem pedir. Talvez até deixe de fumar e apagar este rasto de fumo que os faz chegar sempre a mim. Só quando chover vou poder estar apto a ver o céu sem nuvens e conseguir vislumbrar as estrelas que nele pairam.
Mas, até lá vou continuar a praticar o meu sorriso de plástico, abrir o portão que teima em ranger, a ouvir a voz estridente do meu vizinho e perguntar sem a mínima precisão semântica, chove?

Carta a David Fonseca

Bem, hoje o dia não começou lá muito bem devido à greve normal dos maquinistas da CP, mas não foi por este assunto que eu vim a este site "www.litleboyworld.com" e prestar a minha (como é que se diz!?), a minha palavra, o meu cunho?

Ontem, depois de um dia cansativo no trabalho (diga-se mais mental que físico), depois de uma terrível caminhada pelo comboio da linha de Sintra, cheguei a casa. Como todos os dias a 1ª coisa que faço é largar tudo o que trago comigo no chão, despir-me e meter-me logo no duche. Logo de seguida vem o botão da televisão, sou viciada nos botões, desde o 1º até ao 54(da tvcabo), vejo um pouco de todos, mas acabo por ir parar sempre ao mesmo, o canal História. è o meu canal preferido, vemos guerras, mortes, vidas passadas, não é como os nossos noticiários onde as guerras, mortes e vidas são sempre presentes, mas, além desse canal fixei-me no da Tv2, e porquê? O David Fonseca estava numa entrevista, que por coincidência (tirando o canal História), é o único programa seguido que eu vejo na televisão portuguesa sem fazer o meu "Zaping". A pessoa a ser entrevistada para mim é misteriosa, logo a minha curiosidade não me larga, e a mudança de focos com as camêras como sempre estava óptima, transparece o muito á vontade dos entrevistados. Como boa portuguesa que sou, adoro saber coisas sobre a vida dos outros, e uma enorme curiosidade por eu na minha família ter um tio Fonseca e que a família era de Leiria, será que ele é meu primo afastado? Bem não sei...

Fiquei agarrada ao écran enrolada na minha toalha e com uma meia já calçada, a ver o programa (diga-se muito bem apresentado e seguido), o David respondeu a todas as questões que eu queria saber sem evasivas e esconderijos (será por isso que as pessoas gostam tanto dele?), gostei das questões colocadas e muito das respostas. Como já tinha apanhado o programa a meio, cedo acabou o meu pequeno gosto, quando acabou ainda fiquei na preguiça enrolada na toalha em cima da minha cama questionando-me sobre uma das últimas perguntas, a morte. A morte, nunca sei se devo escrevê-la com letra grande ou pequena, mas considero escrever com pequena um sinal de fraqueza portanto...Para mim é um assunto tabu, não gosto muito de o abordar e de ouvir falar dele, mas gostei ontem, e não senti receio, em geral costumo ficar um pouco atrapalhada com a minha respiração, mas ontem nada, não estava ansiosa nem com medo, deixei-me ficar a reflectir sobre o assunto. A ideia que o David transpôs fez-me pensar e até certo ponto é uma ideia que pode ser seguida e mais trabalhada, mas agradou-me ver alguém sem receio de falar sobre este meu tabu. Tudo isto porque no domingo não consegui ligar a televisão, pois só davam o transporte da SRª Amália do cemitério para o Panteão (situação que me agradou...), mas o facto de ser uma situação de morte arrepiava-me. Não consegui, tive que me dedicar ainda mais ao meu hobbie preferido "ler", o que me fez ir ontem á Bertrand comprar mais uns quantos livros porque esgotei os poucos que me faltavam ler da minha biblioteca, mas quem corre por gosto não cansa, não é o que se diz! Enfim... Isto tudo por causa da "morte", ultimamente tenho comprado imensos livros de Esoterismo, de religiões, mas nenhum ainda satisfez a minha curiosidade nem me retirou o medo de falar sobre o assunto, mas ontem no fim da entrevista fiquei satisfeita e calma, continuei uns 20 minutos deitada na minha cama só enrolada na toalha e com uma meia calçada, fiquei a matutar na perspectiva do David e hoje no meio da lata de sardinhas em que eu vinha no comboio, fez-me pensar e respirar. Gostei.

Não sou uma "dita"fã dos Sillence 4, mas gosto de ouvir a música e escutar as letras com muita atenção, e tentar tirar algum conhecimento daquilo que estou a ouvir, coisa que faço com todas as músicas que ouço, tentar perceber sempre o porquê!

Aconteceu por acaso ouvir Sillence 4, tenho um amigo meu que por acaso é de Leiria e antes de se saber quem eles eram, trouxe uma cassete para o trabalho e perguntou-me se queria ouvir que era de uma banda onde a amiga dele (Sofia) cantava, disse que sim. Ouvi e gostei, mas como tinha o meu gravador estragado não consegui gravar para outra cassete e pedi-lhe, ainda nessa semana estava eu como todas as manhãs a ouvir a rádio comercial e estava a tocar um remake dos Erasure, I try to ...Uma canção que marcou por completo a minha adolescência, fiquei "gamada" naquela versão mais calma, quando o meu colega trouxe a cassete gravada já não foi necessário, o Cd já estava nas bancas. Mas eu continuava intrigada no nome da banda do remake, e a minha supressa foi maior quando ouvi o lado B da cassete e lá estava ela, mas o nome da banda não era conhecido" Sillence 4" nunca tinha ouvido falar. Ao sair da escola á noite depois de uma terrível aula de matemática, passei numa montra da Valentim, e vi o cartaz enorme a dizer "Sillence 4", de manhã antes de entrar no trabalho passei na Valentim e comprei o CD, á noite depois das aulas quando cheguei a casa, coloquei-o no rádio Cd, pus os fones, pois já era muito tarde e fiquei a noite toda a ouvir o Cd, no fim a reacção foi muito positiva. Nunca fui a um concerto deles, mas sempre que podia ouvia o Cd.


Nesta conversa já muito longa, e de passagem já por diversos temas, uns tabus outros nem por isso, o 2º álbum não foi uma surpresa para mim, continuava a ter músicas óptimas com letras excelentes, em 1º plano a referenciada ontem na entrevista, muito "foge" mas muito In.

Continua assim David, continuem assim Sillence 4, que eu continuo a gostar. Em relação ao tema tabu é um assunto que gostava de debatê-lo com mais força e contigo David.

Quero

Quero gritar,
Chorar,
E pedir por mais.
Quero voar,
Andar no alto,
E dizer :?Estou a voar!?
Quero navegar,
Andar de nuvem em nuvem,
E dizer que percorri o céu.
Quero silêncio,
Dizer para se calarem,
E gritar :?Voltei a ter voz!?
Quero viajar,
Passear pelo meu corpo,
E dizer que sou eu.
Quero mostrar,
Mostrar as minhas mãos,
E dizer que tenho palma de mão.
Quero estar cá,
Dizer que estou presente,
E , respirar?

A minha mãe

Costumava vestir uns vestidinhos de folhos, bastante coloridos. Laços no cabelo e quando andava sem eles um chapéu de palha com uma fita branca, perfeitamente colocada. A sua figura agradava a toda a família.
Era amada.
Não era uma pessoa rica em conhecimentos, nem extraordinária nas palavras. Era modesta e dividia a sua paz exterior com as pessoas que amava. Tinha a mania de ficar quieta no canto da sala, com o olhar perdido no tempo, braços cruzados, mordendo os lábios. Por dentro parecia arder, mas por fora não se via nada, respirava muito depressa e ás vezes um pouco ofegante. No seu interior desenrolava-se um mundo de alegria, com muita luz e fantasia onde costumava correr pelos campos verdes, saltar e cantar músicas antigas. Sentia-se a emoção no rosto e faces rosadas.
Chorava muitas vezes. Sem se saber o porquê.
No outro mundo não existiam lágrimas, levava uma vida fácil. Reconfortava-a.
Consolava, tinha imenso amor e compreensão para dar. Muitos conselhos. Muitas vezes tinha que julgar, como quem está num tribunal perante um grande júri. Julgar o que tinham feito ou o que queriam fazer. Era obrigada a discutir e fazer a argumentação final.
Ser mãe para ela na realidade era muito complicado. Não gostava deste papel.
O mundo escondido era um novo filtro para uma vida sem mágoa, sem responsabilidades. Se fosse surpreendida naquele estado, ficava com as faces fechadas de vergonha e de surpresa por não ter dado pelo estado atónito. Por isso costumava ficar atenta ao mínimo dos barulhos, apesar de parecer muitas vezes o tronco de uma árvore, imóvel. Para ter a certeza de não ser apanhada em transe. Mas mantinha na sua consciência que nunca ninguém a tinha surpreendido. Foram muitas as vezes que a encontrei assim, mas tinha receio de a acordar, de despertá-la do seu mundinho. Da sua liberdade. Costumava guardar para si todos os seus pensamentos. só se pronunciava quando lhe dirigiam a palavra. Não falava por falar, reservava-se ao silêncio.
No seu mundo, andava sempre sozinha, passeava por ao longo de rios. Deitava-se na relva por debaixo de uma árvore e ficava a admirar o céu, construindo sonhos nas nuvens. Ás vezes até voava, bem no alto, como uma águia. Chamava as estrelas e ficava a ouvir o tiritar de cada uma.
Passava os dias em segredo.
Ao jantar, quando a família estava toda reunida, recuperava, permanecia calma, mas os seus olhos permaneciam adormecidos. Havia sempre alguma coisa ou alguém que a acordava, um toque nos ombros, o latir do cão quando alguém tocava na campainha. Os grandes olhos da mãe ficavam húmidos, e soltava-se uma lágrima.